Som na caixa

31.8.08

A despedida Bertolt Brecht

Nós nos abraçamos.
Eu toco um tecido fino
você toca um tecido barato.
O abraço é ligeiro.
Você vai para um jantar.
Eu fujo dos carrascos que me seguem.
Falamos do tempo e da nossa
inabalável amizade.Todo o resto
seria amargo demais.

ensaio sobre Adão poesia de robert Bringhurst

Há cinco possibilidades. Primeira: Adão caiu.
Segunda: foi empurrado. Terceira: saltou. Quarta:
apenas arriscou uma olhada para além, que o silenciou
Quinta: nada digno de nota ocorreu a Adão.

A primeira, a de que caiu, é simplista. A quarta,
medo, foi considerada.É inútil. A quinta,
que nada ocorreu, é tola. A escolha fica entre
ele saltou ou foi empurrado. E a diferença entre elas

é apenas uma questão de saber se os demônios
trabalham de dentro para fora ou de fora para
dentro: a grande
questão teológica.

25.8.08

Duas pessoas fundamentais para mim hoje em dia, em termos de visão poética: Carlito Azevedo e Ricardo Domeneck.
Há pouco tempo li o livro do Carlito, tenho o prazer de conhecer o melhor poeta brasileiro.
O Domeneck tem sido a presença mais absoluta em termos de tudo, agora carrego o Carta aos Anfibios aonde eu vá, e de qualquer modo garimpando seu blog fico estarrecida com a qualidade e o conceito que ele traz, e quão verdadeiro me parece isso para ele.

Ou seja, duas pessoas que não só me ensinam, ( uma miragem não é o bastante??)
dois editores cujas revistas babo mesmo,dois poetas que admiro olha nem sei como agradecer a presença deles de alguma forma,

Acho-os capazes de reverterem processos de pensamento e criação, sem endeusar ninguém , são apaixonados pelo que fazem e tÊm responsabilidade com a poesia.

Lógico, aliada à inteligência crítica e criativa.

Pelo que falam e pelos poetas que trazem á tona, sinto-me estranha e deliciosamente atrasada no tempo


É só passar por uma aula com o Carlito para eu me cobrar mais inventividade, outras formas de escrita, qualquer outra possibilidade que possa abrir mais , e que eu possa fugir do eu ( meu umbiguinho não é tão lindo assim né?)
Com prazer recebo poemas que ele nos traz de poetas do mundo todo . È muito bom ter acessso a outras formas de escrita e visão, e de qualquer modo estou encanadésima com esta de termos sei lá quantos sentidos( dezesseis?) e apenas estarmos usando basicamente o sentido da visão na poesia contemporânea brasileira. Que verdade tão chata esta !
Se eu for falar do que o Carlito é para mim, não vai caber por aqui. Foi ele quem me apresentou as três poetas que mais amo: Marianne Moore , Adilia Lopes e Szymborska. Enfim, graças à sua generosidade, os sorteios de livros em aula.

Com o Domeneck, em suas postagens, hoje tive um grande ganho, descobri que posso fazer um dia arte, que tenho alguns instrumentos ( quais sejam paixões por cinema, video e principalmente fotografia, e que por acaso toco um instrumento rsrsr e que por acaso também escrevo. E curiosamente tenho voz.


"poesia não é literatura, poesia não é literatura, poesia não é literatura"

Quem muito fala pouco faz, mas não imaginam a agonia que são as idéias querendo vir e você aí sem gravador, sem mesmo câmera, ontem pela primeira vez, ouvi música no som do gaz do banheiro, e nas gotas do chuveiro vi poesia. Deu vontade de gravar, o riso, o susto, respiração. Por isso entendi ( acho) que a arte que mais amo é mais ampla do que apenas procurar palavras, sons,imagens para imprensá-las ao papel. A sensação até mesmo que de alguma forma estamos, muitos, restringindo a poesia a apenas um campo de ação,glorioso, mas não único. Como primeira experiência, obviamente me senti feliz.

Aos dois, se um dia lerem isso , um super obrigada

poesia de adilia lopes

Com o fogo não se brinca
porque o fogo queima
com o fogo que arde sem se ver
ainda se deve brincar menos
do que com o fogo com fumo
porque o fogo que arde sem se ver
é um fogo que queima
muito
e como queima muito
custa mais
a apagar
do que o fogo com fumo

22.8.08

alguém pode me ajudar??
gostaria de saber sobre o corte das palavras no verso, algo imagino bem pessoal, mas que quero desenvolver e entender melhor

as coisas não são sempre iguais

de um amigo A escrevo uma qualidade. de outro, outra, que pode ser a mesma mas que possivelmente ele não retrataria da mesma forma. assim por diante,duas listas.
por que estes e não aqueles? em qual sombra minha? ou em qual reflexo deitam-se? aonde o "oi" de nossas identidades?

14.8.08

Dear Mrs. Bishô,
I am just a secretary here at FoDA and had to perform a couple of "fodas" (as you say in Brazil, in your most picturesque language), to get to this position, which I intend to mantain by taking any position the Board of Directors of FoDA asks me to. Therefore I am not sure if I can help you. But I wanted to write you and say that I am a big fan of yours, and have been reading everything that Assamambaya Bishô releases for years. I am a minor poet and bookworm myself, and since my intestines tend to disagree with ink, I have been advised by my doctor to ingest my daily ammount of literature through practical suppositories he was kind enough to prescribe. As of late, I have been experiencing problems, because all the "fodas" I am forced to perform at FoDA, in all possible to positions to keep my position, have made the literature suppositories become rather painful. Do you have any suggestions as to how I can ingest my daily dosis of literature, avoiding the two most popular orifices in my anatomy? Maybe crunch the pages and squirt it through my nostrils as some sort of drug?
Warm regards from Paris, Texas

Amy Lowinsky, minor poet.

2:17 PM


angélica freitas disse...
dear amy, thank you for your reply. yes, FoDA is FoDA and a girl has got to do what a girl has got to do and life is not a bed of roses is not a bed of roses is not a bed of roses. as for the daily ingestion of literature, i would do nothing that would compromise the perfect functioning of my rectum and neighbourhooring areas. let us forget freud for a moment. the fact is that it bloody hurts. should literature hurt? there are countless books i would like to see people shoving up their arses. if it is done between two consenting authors, i guess it is okay. cheerio for now, a. bisho.

6:47 AM

7.8.08

acabei de ouvir na tv este comentário de uma mulher que foi entrevistada

- eu estou bem , mas tem gente que não tá.



Boa !
gostei desta de treinar os músculos poéticos

De um modo Júlio Castañon Guimarães

uma fala tramada
de que se extraísse:
-com certeza me recuso
à incursão sem roteiro

do que então se desfiariam
traços de um esboço
( de cena talvez canção)
que buscassem se sustentar
seja nas fraturas de um diálogo
pelos arredores da desolação
seja nos restos já imersos
em alguma sobra do pensamento

para uma mesma fala
de que sequer se escutasse:
- se estropiados os empenhos
pois remonto à recusa

o casamento Anne Stevenson

Eles vão combinar, pensa ela,
mas só se a coluna dela
se encaixar exatamente no peito dele
e só se os joelhos dele
se acoplarem bem atrás do dela,
e todos os quatro
concordarem num ângulo comum.

Tudo estaria bem ,
se apenas
pudessem encarar um ao outro.

Ainda assim
há compensações
por terem de se encontrar
nariz contra nuca
tórax contra escápula
virilha contra nádega
quando dormem.

Parece,ao menos,
que estão indo
na mesma direção.

4.8.08

este título tem desenhado um círculo, um triângulo e um retângulo

Uma conversa jamais se inicia do ponto zero. Não é preciso ser Freud para entender isto.
Uma conversa, principalmente entre amantes, começa em algum ponto culminante.Como uma lepra que se acoxambra até que não possa mais ser risível.
Uma carta, um sinal, qualquer movimento em busca de diálogo, vem com aquela história de treinar frente a espelhos.
Eu não gosto de gente. Eu gosto de algumas pessoas.
No diálogo amoroso eu perco, perco. De vez, 10 X 0. Tudo que se trata de diálogo mistura-se. E daí a porradaria, mais dois gols de resistência,aplacados por febre da torcida, em pânico.
Jamais pão com manteiga no café da manhã.
A não ser que haja verdadeiramente o diálogo, aquele com as 10 leis insistentes de faça isso faça aquilo e os dois façamos
Sombras ou sobras de circunstância. Vai dizer que alguma vez alguém entendeu o seu amor? Aquele que você fez todo embrulhadinho, de presente? Lembra?
Quer empenhar um diálogo?
So ,let´s play, som bem alto

I do live without you
but I prefer with you
so, where are you?
you are not here
so I hate everything here
with or without
i´m gonna live
without you until
you decide for me

Notas:

1- o sr. Inteligência diz ao sr. Poético que tudo isto já foi dito por outras pessoas, de forma bem melhor, ao que o sr Poético manda dizer ao sr. Inteligência o que preferimos não reproduzir

2- se o sr Poético não fosse inteligente, ele não seria lúdico

3- lucidez sem embriaguez, prá quê?

4- o sr Póético convida a todos para se embebedarem com ele, deixando claro para nós que os efeitos são desejáveis





para fabiano calixto, angélica freitas e ricardo domeneck,uma brincadeira da autora

2.8.08

a dor do coringa

eu sou o anêmico
o ponta de faca
o anacrônico
o incidente
o que urge
o que não enxerga
o que instiga
a transposição de
uma melodia afônica
eu sou a irregularidade do sonho
planta que germina e morre
o desordenado
o inabitável
o encravado
a postergação de sonhos
a umidade dos sonhos
a fogueira próxima
em volta da qual fazem festas
onde se vendem ingressos esgotados
eu sou o que se esgotou
o desejo e seus mortos
a voz do nenhum amor
borboleta de sangue
de vez em quando eu azul
que é para disfarçar
eu não tenho disfarce





Nora, 02 de agosto de 2008